Empresa quer desenvolver tecnologia para a produção de petróleo sintético (bio-syncrude) a partir de biogás e hidrogênio verde. Braço tecnológico da Itaipu Binacional, Parquetec soma mais de 15 anos de experiência no desenvolvimento de tecnologias para biocombustíveis e na capacitação de profissionais do setor.
São Paulo, outubro de 2024 – A Itaipu Binacional, em parceria com o Centro Internacional de Energias Renováveis (CIBiogás), a Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável, e o projeto H2Brasil, inaugurou em junho deste ano a sua primeira unidade experimental para a produção de hidrocarbonetos renováveis, também conhecido como petróleo sintético, ou bio-syncrude, a partir de biogás e hidrogênio de baixo carbono, em Foz do Iguaçu (PR). A planta piloto, a primeira no país, irá produzir um óleo com cadeias de carbono específicas para o uso na produção de combustível sustentável de aviação (Sustainable Aviation Fuel – SAF).
“Há mais de 15 anos, a Itaipu tem investido no desenvolvimento de tecnologias para a produção de biocombustíveis por meio da sua fundação tecnológica, o Parquetec, e de outras instituições de pesquisa, como CIBiogás. Já contamos com uma planta piloto de biogás e biometano, assim como de hidrogênio de baixo carbono”, explica Rogério Meneghetti, superintendente de Energias Renováveis na Itaipu Binacional. De acordo com Meneghetti, a Itaipu já tem experiência e domina toda a tecnologia envolvida no ciclo completo da produção de biogás e hidrogênio verde. “Pouca gente sabe, mas a Itaipu, por meio do CIBiogás, foi uma das pioneiras no desenvolvimento da tecnologia e da normatização do biogás no país”, pontua.
Processo complexo
O processo de produção do petróleo sintético envolve procedimentos químicos complexos. De acordo com Meneghetti, primeiro é necessário quebrar a molécula do biogás e produzir o singás, que é um gás sintético. Então ocorre a mistura do singás com o hidrogênio, num processo que envolve calor, filtragem e decantação para produzir o óleo sintético. “Não é um processo simples, tem toda uma engenharia por trás”, diz o superintendente de Energias Renováveis da Itaipu. Após a produção do óleo, ele precisa ser refinado, num processo semelhante ao petróleo tradicional para a produção de derivados. “O petróleo sintético pode ser utilizado para a produção de vários produtos, mas estamos buscando uma calibração do nosso catalizador para a produção de um óleo com cadeias de carbono mais adequadas para a produção de SAF”, explica.
O caminho será longo. Até o momento a unidade experimental ainda não começou a produzir o petróleo sintético. “Estamos fazendo uma série de experimentos. É um aprendizado constante e esse é o caminho natural para o desenvolvimento de novas tecnologias”, diz.
Geração distribuída
Os investimentos da empresa para o desenvolvimento de tecnologias de produção de biocombustíveis não são recentes. Já em 2008, a empresa implantou os primeiros projetos na região oeste do Paraná para a produção de biogás. Meneghetti conta que a ideia do biogás surgiu a partir de uma necessidade da hidroelétrica. “A produção de proteína animal no oeste do Paraná vinha crescendo de forma exponencial e os dejetos dessa produção terminavam em afluentes de rios, que chegam ao reservatório de Itaipu. Isso estava prejudicando a qualidade da água no reservatório”, relata. “Nossas análises indicaram que poderíamos utilizar esses dejetos para a produção de biogás, que além de ajudar a equacionar o problema, ainda poderia se transformar numa fonte de renda adicional para os produtores de proteína animal”, complementa Meneghetti.
A empresa implantou, então, a unidade experimental de biogás, que utiliza restos de alimentos dos restaurantes e resíduos de grama das áreas verdes de Itaipu. “Implantamos uma unidade experimental completa, que faz a trituração e mistura dos componentes orgânicos, o biodigestor, que produz o biogás, além dos demais equipamentos utilizados no refino e produção de biometano, utilizado no abastecimento de veículos da própria Itaipu”.
De acordo com Meneghetti, com a experiência adquirida, a Itaipu passou a fazer projetos experimentais nas propriedades rurais dos próprios produtores. “A viabilidade econômica foi uma marca inicial do projeto. Tem de pensar o que fazer com o biogás, ele é um ativo energético que pode gerar monetização para o produtor. Isso tornar o projeto mais atraente”.
O superintendente de Energias Renováveis da Itaipu explica que o uso mais simples do biogás é para geração de energia térmica, mas para uma parcela expressiva dos criadores de animais para abate, o uso do biogás para a geração de energia elétrica era mais interessante, a ponto de haver excedentes. “Na época não havia a possibilidade de se injetar energia elétrica na rede das distribuidoras, dentro do conceito de geração distribuída (GD), ainda não havia autorização e nem normatização para isso. Assim, iniciamos tratativas com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e com a Copel, a distribuidora local, para que isso fosse viabilizado”, relata Meneghetti. “A partir dessas experiências de produção do biogás com os produtores no oeste do Paraná, para a geração de energia elétrica, é que foram definidas, em 2012, as primeiras normativas de geração distribuída, que ajudou a viabilizar principalmente o desenvolvimento da energia solar no Brasil”, complementa.
CIBiogás
O superintendente de Energias Renováveis conta que, apesar de o biometano e o gás natural serem compostos pela mesma molécula (CH4), não havia uma normatização no país que permitisse essa substituição. “Os estudos do biogás iniciados no Itaipu Parquetec geraram subsídios importantes para que a Agência Nacional do Petróleo (ANP), na época, elaborasse a primeira normativa no país que definiu critérios de pureza para equivalência do biometano com o gás natural. Isso também foi um marco”, lembra.
Dentro do Parquetec, o projeto do laboratório de biogás cresceu, ganhou apoio de outras empresas e instituições como a Embrapa, e acabou por se emancipar, dando origem ao CIBiogás, um centro internacional de desenvolvimento tecnológico e inovação para energias renováveis.
O CIBiogás é hoje uma instituição especializada e autônoma, que atua no ciclo completo de implementação de usinas de biogás e biometano, além da capacitação de profissionais para atuarem no setor. De acordo com Meneghetti, o CIBiogás é uma das principais instituições técnicas do setor de biogás no país, e ela surgiu dentro da estrutura de Itaipu Parquetec. Apesar de a sede do CIBiogás estar ainda instalada no Parquetec, a Itaipu possui, hoje, apenas um assento no Conselho da instituição. “A autonomia do CIBiogás, para a Itaipu, é uma conquista e motivo de orgulho. No futuro queremos que outras instituições tecnológicas independentes também surjam a partir do Parquetec”, pontua.
De a acordo com o Panorama do Biogás no Brasil 2023, documento anual elaborado pelo próprio CIBiogás, o Paraná possui hoje 404 usinas de biogás instaladas, o maior número do país, seguido por Minas Gerais, com 348. “Acredito que isso não é por acaso, mas resulta sim da iniciativa e atuação da Itaipu na região oeste do Estado”, pondera Meneghetti.
Hidrogênio em pó?
O Itaipu Parquetec tem desenvolvido também pesquisas no setor de hidrogênio verde. Os primeiros projetos começaram em 2011. Três anos depois, foi instalada uma estação experimental para a produção de hidrogênio de baixo carbono. Também nesse setor há o desenvolvimento de estudos e experimentos para uso do H2 em mobilidade, assim como análises para a produção de amônia e metanol.
Outra linha de pesquisa, entretanto, é mais audaciosa. Meneghetti lembra que um dos principais entraves ao uso de hidrogênio é a questão do transporte, que demanda acondicionamento em recipientes de alta pressão, processo que envolve custos e riscos de acidentes no trajeto entre a unidade produtora e a consumidora. “Estamos iniciando estudos sobre a viabilidade de inserirmos grandes quantidades de hidrogênio em uma liga metálica, que poderia ser pulverizada e acondicionada para o transporte, de forma bem mais simples e segura. Ainda é só uma linha de pesquisa, mas as grandes inovações sempre começam assim”, finaliza.